Para Raimunda Olivar, lavadeira em São Geraldo do Araguaia
Na beira do rio ela batia a roupa na pedra. E cantava. Aquelas músicas antigas, como cantavam a mãe e a avó. Cantava Que tem Maria?, Navio no mar, Iemanjá eu virei rainha. Cantava com a força toda da garganta. A roupa batida era colorida, as brancas ela esfregava na bacia, com pouquinho de água rás. Junto com a força de lavar a roupa vinha essa força como que de falta, como que de fúria calada por alguma coisa que o mundo lhe fez. Mas não era. Porém a pedra devolvia em resistência, desgastando a roupa mais cedo. Vestia suas saias puídas e ia para a quermesse. Mas ia acompanhada pela família, andava entre as barracas, fazia adeus aos amigos da praça e rezava para Aparecida. No outro dia, era dia da roupa alheia. Raimunda cantava bonito, embalando as outras bocas que cantavam e lavavam roupas e corações no rio. Foi quando eu andava lá pelas divisas do meu lugar que eu conheci Raimunda. Pediu minha camisa para lavar e disse que o faria no dia seguinte, na beira do rio. Quando ouvi aquela mulher cantar, tive certeza de que estava escutando reza, de que me subia uma esperança pelo peito. Batendo minha roupa na pedra, Raimunda me mostrou que ainda existe gente que canta, ainda existe gente que usa a voz para ter força no mundo. J.M.N.
2 comentários:
Tuas palavras são tão verdadeiras que vi através delas esta Raimunda cantar e inspiro-me a cantar para também ter força no mundo.
Te beijo, poeta.
Isolda, minha linda... Essas pessoas são minhas melhores lembranças, digo, as que cantam, as que declamam poemas, tipo você e aquelas pessoas adoráveis dos sabaraus de antigamente.
Te beijo, também.
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