A casa cheira a vultos. Não são de ninguém, esses ectoplasmas.
No entanto, amadurecem, à medida que dou passos para dentro dos cômodos vazios. Olho-os com olhos lassos. Há indulto e cansaço nesse pé-ante-pé no qual me conduzo.
Vou lembrando planos, memórias gastas, algumas anestesias e muitas culpas. Porém nenhuma que me seja única e tão imensa que me impeça de continuar os dias.
Os vultos são sombras de objetos derrubados. Uns sobre mim mesmo, outros sobre a mesa da sala de jantar. Todos são fragmentos de história, iconografia perfeita para romances e anedotas. Sou cercado por eles. Sou interrogado. Entre medo e desculpas eu me vejo sozinho novamente.
E respondo que esse sou eu. Um modo gasto de dizer as mesmas coisas de sempre.
Aprendi que é isso que se deve dizer – a verdade: e este sou eu inteiro, volto a afirmar. Não ser ninguém não cabe agora. Sou alguém que matou mais um, que tem mais uma bala na agulha.
Sou quem espera para encontrar felicidade num copo de leite gelado madrugada adentro e nas linhas que ameaçam se tornarem mais eu do que nunca.
Mais um malandro morreu.
O tiro fui eu quem deu.
Sinal da cruz pelo defunto. Comes e bebes por eu voltar a Santana e seus moradores de mentira.
Estou entrando pela janela do tempo, porém esta é minha casa, digo ao espelho.
Ninguém se lembra de mim.
Os vultos da casa agora ficaram à vontade. Estão dedicados aos seus testamentos. Depois haverá barulho e sorrisos e boas memórias.
Enquanto isso não vem, fico apenas deitado na cama, pensando nela e no cheiro que me deixou nos lençóis. Fico pensando que se não disparo a tempo, todos aqueles fantasmas teriam razão para caçoar de mim. J.M.N.
segunda-feira, 21 de março de 2011
Antes de dormir
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