terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

A última neblina da manhã

Os prédios dormindo em pleno caos
Névoa opaca em todo lugar
Tua gente aberta feito veia
Indo e vindo, sendo a cidade
Tuas praças, cristais, becos e dentes, convidam
Cova rasa da existência em concreto  
Morrem ruas e maltrapilhos sob o olhar de Anhanguera
As bestas e ossos, tirania dos afazeres 
Não sabem que a vida é curta demais
Para essa distância imensa entre sonho e obrigação
Nas encostas esculpidas sem verde
As pernas errantes de quem apenas passa
Não deixam pegadas precisas, descaminham tua pele, um dia rosada
E a potência do que destrói o belo se faz presente
A fumaça de Caetano no topo das notas, no ocaso dos tetos
Abre veredas em minha solidão 
Das noites inteiras de fogo, coração e engrenagens
Nascem linhas aduzidas da tua estranha presença
E essa paixão espessa e estúpida que nutro por ti
Aos que ficam - até mais ver - foi igual a um novo nascer
Eu que parto, já estou perdido sem tua confusa beleza
Sem a destreza que tens de fazer-te amada e mortal diariamente
Volto ao ninho aumentado de tudo o que me deixaste viver
E por tudo o que me tomaste também 

(jmattos)

Pompeia, da janela do 83A
São Paulo

Janeiro de 2019