Tu não me mataste, afinal.
Tolice de quem não estava pronta pra vencer... Eu não estava pronto para nada. Nem mesmo para dissimular minha alegria, ante tua derrota. Ou liberdade?
Caíste como previ.
Mesmo assim, maldita seja a tua resistência. Durou dois anos nossa batalha. O tratado de paz servirá de calço para o destino?
As feridas abertas incomodam é verdade. Mas, bem menos do que os arranhões secretos que, faço bem, escondo no escuro que é o mesmo da minha alma.
Muito pior que ser sozinho é ser multidão, enfiado num saco. Morto, por assim dizer, pelos próprios santinhos doentes que abandonam os andores e provocaram atentados sangrentos em nome de indulgências jamais conseguidas.
Como não tinha mais nada para batizar, ergui minha ira contra ti. Impus meus deuses, meus demônios. Sacrifiquei metros e metros de declarações de amor. De manhãs felizes. Em nome da única coisa que era inapropriada – aquilo que juramos não contar a ninguém.
É muito difícil ser a mão que mata. Pior ainda é ser a morre. Sem voz. Contrariada. Não poderia morrer antes de ti. Isso não. Muito menos por tuas mãos. Antes fosse por teu desvelo. Teu caminhar contrário. Abandonos tem deslumbre por calamidades.
Outonos cantados. Prisões de vento. Meus olhos atentos, já só dizem banalidades. Mas tenho a vitória recente, que me dá um nó na garganta e apazigua as inverdades sobre o meu bem-estar.
Talvez, afinal, nem tenha sido assim, tão vitorioso.
Destruí os quadros da sala, sabia?
O quarto, já não abriga meu sono.
Minha desgraça é que ainda sinto o teu peso. Tem textura esta ausência específica. Tua sombra ainda se amarra à minha e no fim de dois séculos de espera, ainda creio que és minha redenção.
Bebi toda a água-ardente que pude. Fiquei amarelo feito a apatia do engasgo e nada mais me resguarda da vida. Essa que talvez, já não tenha.
Tenho uma confissão a fazer...
Amei como ninguém queria. Como tu não querias. Aderi aos choros curtos para te dar espaço e acalmar tuas pequenices. Miudezas à parte, fui mais intenso. Comi as estrelas todas depois que elas pararam de brilhar.
E tu, o que fizeste?
De nada adiantou tua ternura, não é? Deixa que o resto se apaga. Pode ir que o espelho já me diz verdades absolutas e nestas embarco como que imitado, repetido.
É possível que me queiras ainda, lá pros lados da tua amargura. Mas é tarde de mais para continuar querendo, não é assim?
Continuo a confissão:
Ela me disse que eu tinha tudo, não consigo te ver assim – meu tudo. Malditas confissões terceirizadas. Sempre acredita em tudo o que ouves. Ainda mais, a meu respeito.
Acreditou na traição. Na viagem inventada. Nas flores para o velório da tua mãe. No enfeite de ouro que viera da Bélgica. Eu acreditei também. Inventei tão bem que nem soube separar as ilusões. Por preguiça. Por escárnio.
Tá bom, nada mais para confessar, nem mesmo a minha loucura.
Ainda tenho uma vitória.
Além disso, nada mais.
Andaimes incertos.
O trabalho vai mal. Minhas dores de coluna voltaram. Os excertos marcados a lápis se apagaram. Nosso livro acabou. Nem romance, nem novela. Minha hóstia não se consagrou. Não sou santo. Não comungo das tuas idéias. Minto por que não me reconheço sem ti. Fiquei mais paralítico. Tenho febres inexplicáveis. O dormir sozinho agora me assalta e nem o frio me motiva a busca pelo cobertor.
É possível que te peça para voltar. Não sei se compro um par de chinelos ou uma TV semi-usada. Meu diabetes aumentou horrores. Como eu dizia: talvez nem seja assim tão vitorioso e tu, quem sabe, poderia aparecer um dia desses, só para acrescentar ilusões ao desconcerto que tua ausência me causa. J.M.N
domingo, 28 de junho de 2009
O herói mentido
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