Estava escrito assim: Lembra do dia em que eu parti? Nenhuma estrada foi mais doída do que aquela que te deixou para trás.
Ler um milhão de vezes essas coisas deixadas um ano antes era um ritual, uma repetição consagrada. Como eram já de praxe as súplicas silenciosas pelo reencontro. O telefone que toca sem parar e devasta as esperanças, uma a uma – uma multidão de vozes que nada me dizem ou asseguram.
Rosas mal cuidadas que definham e o gosto já quase neutro do último beijo. Duzentos e vinte nove dias sem qualquer contato e de repente o anúncio da volta.
À frente de todos os sentimentos, a lacuna das coisas silenciadas à partida. O jantar premeditado e não cumprido. Os olhos trocados. As despedidas mal feitas e todas aquelas coisas ligadas aos dois por versos Pessoanos de intimidade duvidosa. Um sem fim de dissabores e noites mal dormidas, mas ainda assim, a soberania do desejo noturno e da aspereza da defesa de corações que batem, batem.
Amores indômitos como as loucas travessias marítimas de séculos antes. A languidez da entrega nas madrugadas sinistras da velha cidade. A cama desabada e entregue ao chão, como um aviso do que seria necessário para que vivêssemos em paz – uma queda e algo que nos aparasse. Um passeio em forma de oito. Um infinito sistêmico em completude e revolta. Mais que isso não poderia ser, dada a infalibilidade da despedida.
Um mês inteiro inventado.
Uma parábola cheia de significados dispersos e o tão imenso qualquer coisa impondo suas sutilezas mais severas e frias. Uns medos tortos, feito o chumbo estilhaçado de tiros. Alma fatigada. Ela que nem sequer tirou a roupa e encheu suas malas com raiva e desespero. Meu tecido emprestado. Carne que não cheira a mais nada.
Mas o que vale é o lirismo. O sentimento todo das coisas a dois. Eu não queria ter feito aquilo. Poderíamos ter dormido juntos e só. Perdoe-me. Foge comigo?
Já não é pouca a distância. O tempo consumiu os relógios que eu tinha e agora meço o tempo com ampulhetas. A precisão da areia descortina novos ritmos.
Oi, mais uma vez. Penso sempre em ti. A saudade é como um abismo pelágico. Nem sempre sinto a tristeza. Ela é maior quando deito e não levanto. Durmo sempre de prontidão para o caso de voltares.
Conheço a cidade dela. Tem uma lagoa chamada Conceição. Nos barcos que vejo nela, estão aportadas as coisas que eu nunca lhe disse por preguiça ou combustão. Também tens responsabilidades não assumidas e esta certeza me dá apenas tristeza, pois agora que não estás aqui, não posso te convencer de mais nada.
As cartas que escrevi desde aqueles tempos são papiros hoje em dia.
Até quando vai haver desilusão?
Essas perguntas vão para ti.
Amor nem sempre é seguro. Mas e eu com isso?
Quando descobri que não estavas mais lá, já era tarde e o elevador partira. Fiquei num interposto, descrente que existia, mas confirmei essa dor depois que vi os meus, reunidos, alegremente perguntando por ti e ao confirmar que partiste seus olhares eram mortos, repugnantes como quisessem dizer que sabiam.
Deste outro lado no mundo, as pessoas são menores e pensam mais. Tenho medos ainda sobre as coisas da escuridão. Nunca troquei a boca com que te beijei e caso queiras saber é o mesmo gosto da minha água, o teu beijo.
Amor! Aposto que nunca viste uma lágrima dourada!
As embarcações não tardam. A lagoa Conceição é feita de ti também.
A padaria que fica perto da tua casa tem os melhores quitutes. Os amanheceres seriam melhores se fossem adoçados com aquelas coisas que vendem lá.
Amor! Já vou de viajem, faz ternuras no meu sono?
Tantas coisas a pedir. Tantas outras para esquecer.
Lembro da tua roupa íntima e do cheiro das tuas carnes escondidas. Não fique envergonhada, tenho apenas memória, só isso. A tua camisola não tive coragem de entregar.
Quero um instante que seja nos entremeios das tuas pernas. Não diria nada senão movimentos erráticos e apaixonados. Um furor que aumentaria caso dissesses os contumazes nãos. Nada mais que brisa. Uma morte pequena e derradeira. Não queria estar de volta. Poderias me consumir inteiro para não sobrar nada para esta solidão desconcertante.
Amor eu menti. Falei que iria dizer sempre a verdade. Não foi assim. Apesar disso confessei minha traição. As mulheres querem coisas acabadas e fotografias destruídas. Você mais que todas.
Por tantas coisas que eu não sei responder ao certo. Pelas pequenas porções de vida que tive quando me lembrei de nós. Pelas idéias de eternidade. Minha verdade é tua. Minha saudade se arrepende de não ter iniciado antes, enquanto estavas lá para colocar tudo que me escapa agora de volta em meu peito. J.M.N
terça-feira, 30 de junho de 2009
Mentiras de junho
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