domingo, 21 de junho de 2009

Diário da tua ausência VI

21.06.09 (3:28 a.m.)

A cidade se prepara para me abandonar novamente. Encontro na exclusividade da chuva interna desses dias, a razão para crer que tudo está definitivamente voltado para o meu abandono. As ruas, as marquises, as mangueiras e os cheiros úmidos da terra que amo e renego, desprendem-se de seus lugares e transitam entre um escrito achado e uma inconformada saudade de coisas perdidas recentemente. Apego-me aos poucos amigos que ainda perguntam o que existe por detrás de meus olhos cansados e meio dormentes nesses dias turbulentos. Seus abraços confortam, mas deixam-me partir em silêncio. Como se nada houvesse a fazer ou somar aos seus carinhos verbais. E queria tanto pedir para ficar, para dormir entre vizinhos, pertencente a algo que não é apenas uma minha ilusão (medindo a minha altura, sendo aquilo que realmente sou). Torcendo para que cada um desses abraços funde em mim uma resistência contra essas manhãs sozinhas, telefones mudos e portas não usadas. Madrugadas sem a presença de nada nem ninguém. Por pouco não provoco acidentes em meio a músicas sentidas e lágrimas de amor. Por pouco não escapo morto depois de tanta vida ter passado por meus poros. A cada passo um novo começo e a soma de todos os meus medos a apagar meus passos mais seguros, antes tomados por bravatas e solidões cedidas, conjugadas. Estou de volta ao lugar nulo em que me encontrei com o primeiro raio de sol, quando não podia distinguir felicidade do seio farto de minha mãe ou de um beijo apaixonado. Estou estancado num pranto longo e delirante, cujo estado de arte remete aos mais longínquos quadrantes deste corpo que por ora, apenas executa movimentos repetitivos, desprovidos de sentido ou vontade. A cidade se prepara para me deixar suas esquinas desnudas, para imprimir pavimentos sonhados em ruas abandonadas e sem iluminação qualquer, em cujos traçados perfazem-se meus temores ancestrais, minhas virtudes abandonadas à partida. Anulo as equações de despedida. Sinto os cheiros ornamentais de uma fé jamais retomada e penso nas mãos dela a tratar de minha alma tão desencontrada, em movimentos que surgem como bençãos, transformam-se em afagos e vêm retirar, como num passe de mágica, toda a dor de finalmente estar conhecendo a solidão. J.M.N

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