Estão todos quietos nas fotos. Seus risos estáticos lembram-me que sim, eu estive no meio deles, porque quando percebo, meu riso está igualmente parado no tempo, cravado nas ruas de lá, quem sabe pedalando entre castelos, escarpas de pedra e oceanos.
Minha casa nunca chegou a ser um lar. Minhas caixas amontoadas me dizem partidas todo dia. Quero perder essa ideia de que o tempo foi perdido, de que as coisas agora acontecem por que deveriam acontecer. Seu endereço mudou, mudei a minha fechadura. Todos no prédio perguntam de ti. Todos em mim já se despediram.
Não posso culpa-la por ter me deixado. Eu faria o mesmo e ainda por cima escreveria em letras bem vermelhas no espelho do quarto:
Enquanto cresce esse exagero
Enquanto acrescento ruas à cidade
O pavilhão tomado arde
Derrubarei os muros dessa cadeia
Enquanto o peito esconde
Todo silêncio acontecido anteontem
Nasce no riso esse desconforto
Eis a força que antecede a liberdade
Depois disso, deixaria as chaves no pote, sobre a mesa da sala, arrumaria o tapete da entrada, chamaria pela última vez o elevador e ao cheirar a rua bem no meio da noite, sentiria um breve perfume de madeira seca, a esperança nascendo sobre a pele de meus braços e essa música tocando bem alto na parede do que, àquela altura, chamaria de memória. J.M.N.
A música que tocava…
2 comentários:
Fico pensando de onde vem tanta inspiração???
Ou guardas os textos por anos e depois publica-os?
Fico realmente surpresa com a capacidade de tocar na ferida da gente.
Lindo esse texto.
Flávia
Que música maravilhosa... ficou perfeita com o texto.
Erika
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