quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Crônica da Casa Assassinada

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Quando comecei a ler Crônica da Casa Assassinada, em novembro de 2007, não imaginava que tinha em minhas mãos um dos livros que me mudaria, que causaria uma angústia caudalosa e, por vezes, uma certa raiva por ter decidido ler o texto de Lúcio Cardoso, em meio a tantos acontecimentos por si angustiantes e furiosos, que tiveram lugar em minha vida, no mesmo período.

Mesmo admoestado por Fausto Wolf, que escreve na orelha do livro: Para início de conversa, você, leitor, está de parabéns [...] porque nun fim de século medíocre [...] se prepara para ler uma obra prima - eu não tinha dimensão da profundidade e força do texto deste magnífico autor de Minas Gerais, nem tampouco que levaria cerca de um ano para terminar de ler o livro em meio a idas e vindas, releituras, anotações, desamparo e muito material fundante para minhas pobres linhas.

Pode parecer um chiste ou simples retórica de comentarista. Entretanto, no caso de Crônica, qualquer exagero é paliativo frente ao poder das palavras ali contidas e das tramas alinhavadas ora com lirismo, ora com ódio e amor incomensuráveis, ora com a mais clara clave de delírio, paixão e talento literário, características que colocam o livro no mesmo patamar de muitos clássicos da literatura mundial como Os Irmãos Karamasov (de Fiódor Dostoiévski), Fausto (de J.W.Goethe) e Cem Anos de Solidão (de Gabriel Garcia Marques).

Ainda hoje volto àquelas páginas perplexo, afoito. E quando me lembro de uma passagem mais tocante, não raro tenho a sensação de que acabo de me lembrar de uma impossibilidade humana, de um sonho ou de uma memória genética há muito esquecida ou incorporada como informação de espécie. Sem exceção, volto às páginas emocionado, mobilizado pelas frases e sons que na Chácara dos Menezes (família dos personagens principais) reverberam como um pedido de socorro, como uma história que macula ou edifica vidas conhecidas e semeia muitas noites mal-dormidas com surtos de amor, dor ou alegria desenfreadas.

Crônica da Casa Assassinada é um livro para se ler apaixonado. Em sobressaltos. Pois mesmo que esta não seja uma característica prórpia do leitor que o vier a abrir, certamente será o estado em que ele se encontrará ao fim daquelas páginas. Não se fica imune ao texto de Lúcio. Não se pode ficar. É como água em pedra. Inexoravelmente o destino de redenção se cumprirá e neste momento é que tantas possibilidades psíquicas se abrem, tantos olhares e vozes e sombras se locupletam e o leitor pode experimentar ser qualquer um dos personagens de Lúcio.

Mas cuidado!

Como disse Manuel Bandeira, os personagens do romance (Nina, Valdo, Timóteo - ah! o soberbo Timóteo, Ana, o Padre Justino) tendem a continuar vivendo em nossa imaginação, mesmo depois de findada a leitura.

Pena que meu pai não lê mais romances, gostaria imensamente de saber-lhe as impressões sobre este monumento literário, pois além de atualíssimo, o romance de Lúcio Cardoso tem este tom transgeracional, que impregna a marcha da leitura e confere uma vagarosidade quase avaliativa e nada domesticável, atualizando as perguntas secretas que pais e filhos, irmãos e irmãs, enfim, que familiares se fazem a si mesmos e uns aos outros (em certos casos) ao longo dos anos de convivência. É, ademais, uma elegia ao vulto transformador das paixões humanas, das quase não confirmadas armadilhas que a vida em grupo se nos coloca e, sobretudo, do não dito fulminante que muitas vezes se agiganta no seio dos amores familiares.

Originalmente publicado em 1959, Crônica da Casa Assassinada é seguramente um dos alicerces do romance brasileiro moderno. Um dicionário de consulta e reparo para qualquer aprendiz de escritor. Uma fonte inesgotável de furor, achaques, frêmitos e regozijos, em cujas páginas se acha muito, mas muito mais do que ficção. Pode-se nelas achar a virtude, o devaneio, a paixão, o ódio, o remorso, a vaidade, a agonia, a temperança, enfim, muitos adjetivos, sensações e substâncias de nossa existência mais humana. J.M.N

4 comentários:

Anônimo disse...

Excelente!!!!Estou muito tentada a ler a obra citada.

Belas palavras sobre a mesma.

Você também está entre os melhores escritores que considero!!!
beijos,

Cida

@alsoweeproses disse...

Olá tudo bem? Sou de Bh, e tenho que fazer uma peça de teatro da cronica, teria como vc me ajudar? é urgente !

vc escreve muito bem, PARABÉNS !

José Mattos disse...

Oi "Mandioca",

te ajudarei com o maior prazer. Mande-me um e-mail para iniciarmos o contato: jmattosneto@gmail.com.

Abraço,

J.Mattos

Anderson Carnot disse...

Bom dia. Sigam minha página no Instagram
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