Para Virgínia
Há festa e música nos seus olhos.
Vejo de longe um povo desconhecido esperando sua benção. Fazem fila.
Tenho raiva destas pessoas que ganham sua atenção. Vou me aproximando com minha ira contida.
O portão da frente vira um púlpito. Eu regurgito. Chega de esperar que ela me veja.
Seu olho é mais para mim que um sinal de boas vindas, é a certeza de que ganhei humanidade, de que posso ser chamado de humano.
Ela continua a abençoar os estranhos.
Minha vontade de ter raiva e enfurecer os seus deuses acomete mais forte.
E de repente ela está ao meu lado.
Delicadamente diz naquela voz que nunca foi deste plano: sabe a manhã em que você nasceu? Foi o dia mais feliz de minha vida.
A noite suportaria toda espera.
O portão incandescente, cheio das iluminuras que ela causava ao fazer sinais da cruz em suas cabeças vai ficando marcado em meus pensamentos como um portal para o distante, para o repleto. Daquele ponto em diante, jamais senti medo de cruzar limites, de mudar de rumo.
Ela olha para trás e me vê sorrindo. Aponta em minha direção seu dedo mais miúdo e diz alguma coisa para quem a espera abençoar.
Uma lágrima, refletida no olho estranho e eu tive a certeza de que ela falava a meu respeito e junto com isso dizia algum conforto para aquele homem cheio de cordões e tristeza.
Jamais tive outra impressão tão marcante da santidade.
Minha proteção nasceu aqui, entre os mortais.
E para evocá-la, basta lembrar aquela noite, basta ter uma lágrima a disposição.
O que tem de mais sagrado em mim, mora naquela imagem.
Uma noite de bênçãos à vizinhança, há muitos e muitos anos, sua voz mansa me dizendo âncoras e balaustres e, por fim, a certeza de que ela esteve me esperando desde antes de eu chegar. J.M.N.
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