No 18 de Maio, Dia Nacional de Luta Antimanicomial
Onde estão meus portos? Viverei nesse eterno passar por margens de Susana limpando lágrimas nas mangas vetustas da camisa de aninhar, num gesto atávico repetido e herdado da minha e da mãe dela. Onde a mansidão dos beirais espargindo a chuva que enviei só pros olhos vespertinos de Susana? Desde onde os ventos me convocaram à varrição das ruas é que me desencontro de colos e janelas abertas para as estrelas. Desde pequeno tive clarabóias. Disso veio o meu domínio da geometria austral, da intimidade das constelações. Eles não entenderam esse meu novo dom de profetizar os movimentos dos brilhos mortos, e quiseram me amurar com químicas e faixas brancas. Mal sabiam que fui feito com calibres de pássaros e nuvens. Com bitola de tempestades amiúde. Mal sabiam de meus enlaçamentos com a voz que nomeou tudo. Mal sabiam da mensagem que se enrodilhara nos labirintos tensos do meu ouvido desde que Susana me deixou. Não sabiam do alistamento e nem da missão. Não obstante o esgar de todos, salvarei cada um ao revelar o avesso oblíquo de suas rotinas. Teremos todos as piores guerras, as íntimas. Mas gastarão apenas duas estações de chuva. Cessarão quando o musgo vencer a última lança da última cerca. Quando a última porta se abrir, o rangido das dobradiças e o baque do ferrolho aberto forjarão o bramido de homens livres, e de mulheres livres também, que os amarão sem distâncias, desculpas ou favores. WDC
2 comentários:
Data emblemática, que sempre, sempre, merece uma homenagem, passem-se os anos que forem.
Ainda hoje olhei para o Zé, aquele que ninguém mais vê. Ele está sempre ali, mas pouca, pouquissima gente o vê. E toda essa luta é para que eles (nós) não fiquemos assim, invisíveis e esquecidos..
A minha loucura cabe num potinho de geléia usado, assim como cabe na imensidão dos portos espaciais que jamais verei.
Minha loucura pende para o lado de dentro e desde lá agita os mares, pois aprendiz de desastres naturais.
Minha loucura quer o cuidado daqueles dedos incrivelmente macios e disponíveis, feito as patas de uma aranha que me enrredara para sempre.
Tão grande e tão miúdo. Minha loucura é bem mais livre que minha sanidade.
Ainda bem.
J.Mattos
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