quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Nunca sabemos que coisas serão deixadas para trás

O tempo passa e as coisas se misturam na decomposição das memórias. Aquilo que fica já é imaginário, nasceu dos escombros do que se viveu e por isso mesmo, nasceu puro, reinventado. São imitações do que se passou. Café coado em pano de linho, o melhor gosto, sempre com sobras no fundo do tacho. Tudo que ficou ainda me acompanha. Como amigos segurando a minha mão por essa estrada incerta e derradeira que cruzamos. Os cheiros, os gostos, as pernas adoradas, as mãos macias que me acalmavam na infância – tudo fica, tudo vira reboco em nossa casa de carne e ossos e significados. Tudo quanto se foi me volta agora que mais um ano acaba. E volta na fuzarca das desistências, na vertigem da entrega. Indecisas coisas entre minha loucura e a infinita mansidão do que procrio, essas linhas sedentas, alugadas como alegria de dia inteiro. Vêm diante dos meus olhos, confrontam minhas covardias, as coisas que nasceram mortas em minhas lembranças. Vêm desculpadas e bandidas, evocadas no esquecimento de quem mais amei. Guardadas nos abraços dos amigos reencontrados. As coisas que deixei para trás vêm logo depois dos meus passos, reinando soberbas pelo caminho que tento mostrar aos outros. E estes pisam por sobre as tais coisas. Não importa, elas sempre seguem adiante. Durmo envolto nelas. Acordo com seus restos nas minhas lágrimas matinais. De tudo o que fiz, de tudo o que conquistei ficou muito. Frações de dias felizes, somas de terríveis finais, múltiplos do amor que me inventa e redime, todas as vezes que me deixo para trás. J.M.N

Um comentário:

Anônimo disse...

Lindo!
Espero que continues por aqui, escrevendo essas coisas lindas.
Feliz ano novo.

Bia