sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Os Ecos da Lapa

"Seus pios enramados
de muito se sonhar
Vêm ferir sobre mim"

Manoel de Barros - Noções sobre João-Ferreiro
Para a Clara, a Lala e o Tom, cujas vozes sararam as feridas do dia.

Meu ânimo às vezes mói a carne, faz sujeira. Ultrapassa os limites. Engana as receitas médicas, trapaceia em ressonâncias. Acho que morrerei de engano, ninguém saberá dizer. Mas hoje não! Não nessa noite memorável em que cheguei em casa com o mais fundo dos desejos, com a mais rouca das saudades. Velando as lombadas dos meus livros preferidos e esperando me transportar, como numa mágica, para entre os arcos da Lapa. Foi de lá que me veio um sopro transformador. Uma revelação. Na voz de quem eu jamais esperaria. Declarando saudades que eu demorei alguns segundos para compreender que sim, eram minhas também. Um desfalque de razão, neste preciso momento. Mais um, aliás. E depois foram elas e descortinar minhas vontades de ser de alguém. Sem saber, eternizaram cinco minutos de um dia cheio de trabalho e dúvidas, rudeza e apaixonamento. Uma me contou a impressão de que a cena esdrúxula era cabível. E mais, lembrara de mim. Depois foi a vez da dona da voz. Parte integrante desta minha ontologia de raiz tapajônica. Diz que quer escrever nossos símbolos na pele. Faremos isso. Meu ânimo, às vezes, me destrói. Mas hoje não. Hoje eu tenho o riso e o pleno sentido de que pertenço. Hoje eu ouvi as suas vozes e suas vozes couberam em mim de ponta a ponta. Completando o mais sem jeito dos meus fins, o mais arriscado dos meus intentos. Emprestando seus tatos para minha caça aos ventos velozes da existência. J.M.N

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