sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

O protocolo do distante (ou a faculdade de esquecer-se pelo caminho)

“Restos de pessoas saindo delas mesmas
aos tropeços, aos esgotos […]”

Manoel de Barros - Gramática expositiva do chão, p. 40.

Tempos depois ele se descobre no mesmo ponto em que se entregou. É noite, o calor é o mesmo. Nada de frágil, apenas um ardor na euforia. As pessoas sãs de sua vida em hospitais vendo seus corpos mentirem virtudes. E ele encostado na mesma árvore. Brincando com o tal aparelho da mesma triste maneira. Decidindo se entregava os pontos ou se despedia para sempre. Fechava o ciclo. As letras dela ainda pairando sobre sua casa de vento. Ruídos se encostam nele e fingem brincar de razão. A fuga dos pios e latidos o estremece. De repente, a volta se completa. Seu organismo animalizado naquele instante, implode. Ouviu que sonhar é despertar-se para dentro. Ouviu mais, que a tintura que cobre a noite é apenas a resultante das manhãs não usadas e que os olhos mentem a cor do luar, constantemente. Desesperou-se por um instante. Teve comportamento de finitude sua pupila. Encontrou-se no cisco. Diminuto e recolhido em coisas que apenas incomodam. Chega dava áspero em seus beijos. Chega trituravam-se as vaidades de suas roupas. Mas a razão dos loucos o resgatou. E ele premiu os botões. Manteve-se em segredo, todavia. Amputado deste mundo, num passado irrestrito e claudicante. Atirou-se das culpas. Mostrou-se todo para as incertezas e fez um vento forte neste instante. Foi reconhecido pelos astros e tropeçou na desesperança por um segundo, mas seguiu em frente. Contentou-se em mostrar-se sem seu nome. Um toque apenas… testou-se. Mas decidiu-se por dois. Não houve eco, não ouve universos partilhando a nova noite no lugar de novo. Não houve respostas e verbos para sangues. Por Deus, não houve a admirável estrela do encontro. Mas riu-se assim mesmo. Primeiro de si. Depois por sua condição de homem. Riu-se do mar de sentidos desencontrados, da figura que nunca lhe sai das costelas e calabouços obscuros dos fatos diários. Morreu um pouco. Mas só o suficiente para sentir saudade de si mesmo e optou por concluir sorrindo que ela jamais fazia trégua. Era afeita aos combates de morte. E o dia amanheceu num de seus suspiros e seus passos andaram mais rápido que suas incertezas. Lembrou-se que ela existia em sua lousa, como um rabisco por finalizar. Na explicação de seus desatinos, na imagem do filme antigo. Lembrou-se que ela era mais coisa dele do que um ser propriamente dito. J.M.N.

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