quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

De certezas e algumas culpas

p/ meus pais e meu irmão

Quanto mais tento esquece-los, mais me tomam. Quanto mais grito independência, mais desalinho o pêndulo do que sou e do que fui. Tantos anos a procurar as conversas que não tivemos. Tantos desatinos tentando buscá-los na dor das perdas. Estou cansado. E sinto que é assim que deveria ser. Este cansaço é por saber que é impossível. Que não se separa a biologia dos feitos de amor. Queria dizer que sou deles, como as rimas são próprias dos versos. Quero dizer que meu lugar no mundo é um mirante de onde enxergo o que não tive, mas encontro tantas e mais razões para saber que fui amado, que não importam as distâncias ou os anos engaiolados nas displicências e dúvidas. Sou muito daquilo que eles não queriam que eu fosse. Mais imprudente que alguns meliantes. Mais pela metade que certas frutas colhidas. Sou de tantos modos um estranho que nem sempre os espelhos me acolhem. Quanto mais insisti em diferenciar-me, mas me igualei ao que não queriam que eu fosse (em parte o que são, em parte o que jamais quiseram ser) e sei que os silêncios não são de abandono. Sei que as ternuras são sempre escolhidas e que, às vezes, dói mais neles do que em mim. Digo-lhes para não chorarem em ombros estranhos, as suas dores. Não buscarem o conforto dos claustros para fugir do que não sabem responder. Também sou inconcluso, sou raro com cada qual neste mundo. Às vezes queria perguntar-lhes quem sou, mas prefiro saber o que não sou e nessa conversa solitária, mas feliz, encontro a única resposta que me vale, a única sentença que jamais me escapa: meu lugar no mundo sou eu que faço, graças ao que aprendi com eles. J.M.N

6 comentários:

Fábio Martins Faria disse...

Caro Jose,
me identifiquei muito com o que vc escreveu. Tb aprendi muito e o mais importante da vida com eles. Meus pais me deram, junto com muito amor, o senso ético e de solidariedade. E tantos anos que estivemos juntos não foram suficientes para esgotarmos as conversas. Culpas que reforçam a certeza de minha fortuna. Abçs, Fábio

José Mattos disse...

Caro Fábio,

Seja bem vindo ao Palavras... Obrigado pelo comentário.

Abs,

J.Mattos

Anônimo disse...

Muito tocante isso. Realmente falar de família nos leva a esses sentimentos tão controversos e por vezes dolorosos. Muito bom o texto.

Bia

Anônimo disse...

Te amo meu poetinha!

Ass: Mano

José Mattos disse...

Mano,

Faz tempo que te espero aqui.
Sabia que virias.

J.Mattos

Anônimo disse...

Muito tocante seu texto. Faz lembrar que não estamos sozinhos e mais, que não devemos nos esquecer de quem nos precedeu.

Lindo,

Luciana