quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Tucumã

Kasper Lutcho badalava em Tucumã. Chegara com as primeiras fazendas de gado da região. Ainda tinha dúvidas se seus domínios iam além ou atrás das porteiras que cruzava. Um dente de ouro no sorriso triste.

Estava naquelas ruas desde que eram apenas picadas. Cortara o mato do lugar com suas próprias unhas e, arredio aos puxa-sacos, trancava-se depois da seis e só saia com o cantar do primeiro galo.

Mas como badalava, então?

Pensavam que ele dormia. Mas ao fundo da fazenda Maria Tereza, que era sua maior propriedade, atalhou uma lista de terra até o cabaré da Nona. Não sentava em mesas. Sua escada estava sempre desocupada. Subia e se deitava com Arminda, Pessoa, Marieta ou Cristina.

A todas amava com presentes e poucos sorrisos. A todas delegara a tarefa de fazê-lo esquecer Dinamite, ou Carminha Sintra como era conhecida ao cantar nos palcos do mundo inteiro.

Kasper falava com poucos e nas noites enxertadas de saudade, nos braços das damas que emprestavam seus corpos para o sonho, ele explodia em fúria aguerrida. Como um lobo privado de alimento a dias, como o corvo pressentindo a carcaça ao longe.

O amor de suas unhas nas costas era um talho. As meninas se deixavam de molho duas noites depois que o serviam. E isso tudo por causa de quem partira.

E como é longa a espera pelo que se foi, bradava. E voltava a pé pelo caminho escuro. Sem blusa, mastigando o mato, pensando que Tucumã era sua cadeia em chão de ouro, era seu destino em silêncio de amor passado. J.M.N.

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