sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Feitiço

Eu pus meus dedos em ti. Dentro da tua imaginação inconsistente, dentro das flores que abrias quando te encontravas com os destinos de teu corpo. Eu pus acordes em teus novelos e desembaraço nas tuas coxas, porque eu podia e queria te fazer mais minha. Eu pus açúcar em tuas doenças e combustível em tuas fogueiras. Simplesmente porque queria saber o sabor do teu dentro, o mais perfeito encantamento do teu amor. Eu pus agulhas no teu sono e frágeis cristais sob teus pés. Nada de pretensões ou adultérios, eu pus fagulhas na tua noite. Sem mistérios ou sentimentos. Apenas ambos morrendo de fome pelas grutas do desejo, arcando com o que não podiam para ser um do outro. Eu pus hemisférios em teu mundo, particionando a existência entre ti e aquela outra. Outra realidade menos morta, menos paralítica que fosse. Eu fiz canteiros em tua cova. Brinquei de deus em teus quintais. Matei e morri mil vezes enquanto fazias os sinais da cruz, perpetuamente culpada por ter chegado dentro de mim e escutado os cantos negros da minha paz aventureira. Eu pus tantas coisas entre tuas pernas. Tantos universos entre teus sonhos. Nada menor que tudo, nada afeito a retidões. O fiz porque podia, porque pediste, enfim. Confesso surpreso que não atentei para o que em crescia junto. Para as idades de sortilégio que se faziam em mim enquanto eu te pregava na cruz. Eu pus o gosto dentro de ti e sacrifiquei toda razão que me mantinha. Eu te pus dentro da sombra, daquilo que podia ser, mas não quis. J.M.N.

Para ler escutando...

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