Um dia desci no porto de Lille. Era Dezembro.
Fazia frio e eu parei para escrever isso.
Ficou perdido até hoje.
Era possível avistar o porto da janela de Cecília.
A tarde bronze daquele dezembro maldito, anunciava uma noite não menos densa e metálica.
De bruços, na beira da cama, Cecília tinha as costas iluminadas pelas luzes amareladas do entardecer e repousava com a respiração violenta das horas seguidas em que se estiveram.
Ele acendeu o cigarro e pegou a caneta e o caderno surrado que sempre trazia consigo.
Borrou as duas primeiras linhas sem escrever uma sílaba sequer e depois, arriscou compor para ela.
Era muito mais do que podia suportar. Cecília não cabia em rimas, em estrofes ou solfejos. Mal lhe cabia nas horas do dia.
Estava para sempre acercado dela e mesmo assim, não podia suportar sua presença.
Talvez porque soubesse que isso lhe seria eterno.
Praguejou contra a perfeição de Cecília e cessou seus esforços para produzir-lhe um verso.
Vestiu-se em silêncio e pegou o sax na saída. Quando abria a porta, ouviu baixinho um quase sussurro dela, - Você vai sair? Perguntou ainda deitada.
E ele respondeu com uma brandura pré-fabricada, - Vou comprar cigarros meu bem, volto logo.
Desceu a rua lateral, descobriu no bolso do casaco, uma partitura esquecida e começou a tocar a velha composição, lembrou-se de que a tinha composto para os inúmeros olhos que deixou para trás.
Sentia-se pela metade e preferiu, como sempre, ficar sozinho.
Entendeu de imediato que não voltaria e decidiu, conforme erguia seu sofrimento, dedicar a música sem nome que tocava, encostou-se num muro e escreveu na beirada do papel: A Cecília que acordou a meu lado e agora, dorme sozinha. J.M.N.
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