quinta-feira, 8 de julho de 2010

Cartas a ninguém (07.07.2010 – 4:58 a.m.)

De dentro da noite veloz.

Querida Frederica,

Encontrei nossas fotos. Estão novas e a brevidade do que tivemos encontra-se estampada nelas para uma eternidade de desculpas e senões. Encontrei as tais fotografias não por acaso, não por descuido de estar atrás de outra coisa, de outros ecos celestes. Procurava naquela tarde vazia, uma lâmina que me abrisse sorrisos, que me desfigurasse o rosto e fizesse surgir outra imagem no espelho.

Por tanto tempo evitei olhar aqueles quadros. Imagens de um tempo que parece tão ativo e envolvente. Mas que aguarda, silencioso, as tuas palavras de amplidão e cheiro vário, cujas formas indispensáveis, faltam ao meu padrão de batimentos. Meu pulso desconfigurou na ausência. Minhas vértebras desalinhadas causam dores.

Não foi, decerto, um olhar de idolatria ao passado. Foi uma captura presente e incessante que cabe em promessas e frases ungidas à eclosão dos universos pendulares de nossa entrega. O que vi, Caríssima, foi adoração reincidir feito um movimento perpétuo, irretocável em sua armadura. É assim que ainda penso em nós. É por esse viés que junto postulados e dogmas e arrebento esse meu verbo a dizer que amo.

E ao redor desse grito aflorado fica a carne viva. Viva na imensidão do que não dissemos no último telefonema. Viva na linha tranqüila de tua voz que me cobrou tão pouco, que parecia tão cansada. Ou o infinito inefável do que juramos um ao outro. São prisões de enredo esses meus olhos vendo as fotos. São como sobreviventes de um bombardeio.

Por um lado, guardam a certeza de que as explosões, a fumaça e os estilhaços não acabaram com suas vidas e, por outro, dançam indecisos, aguardando descobrir o mais depressa possível se o que marcará a melhor lembrança será a desgraça ou a esperança.

Sinceramente,

J.Mattos

2 comentários:

Anônimo disse...

Essas cartas pegam a gente de sopetão. Trazem coisas que a todos tocam. Não tem como escapar da angustia, da dor, do amor que elas mostram com tanto brilho e muitas vezes com uma ponta de sofrimento.

Amo ler teu blog. E amo esta nova possibilidade de estar por perto mais uma vez depois de tanto tempo.

Tua adimiradora sempre.

Anônimo disse...

"[...]São como sobreviventes de um bombardeio.

Por um lado, guardam a certeza de que as explosões, a fumaça e os estilhaços não acabaram com suas vidas e, por outro, dançam indecisos, aguardando descobrir o mais depressa possível se o que marcará a melhor lembrança será a desgraça ou a esperança."

Achei que teria muitas coisas a comentar sobre essa carta. mas ao ler percebi que tudo já está dito nela. e é tão duro e cândido ao mesmo tempo. Tão naturalmente feroz e delicado que chega a incomodar.

É isso, teus escritos me incomodam.

L.