quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Paternidade

Ao Saramago, aos meus Josés e ao Cauê.

Uma dose interminável de esperança encapsulada num homem. Ser que espera a redenção do que é impossível ser redimido – obrigar à vida uma semente. Perdão que não surgirá antes daquele endereçado a si mesmo. Perdoar-se até chegar a ser. Eu sou o que sou, mas posso ser outra coisa, caso precises, caso seja necessário meu filho. Pai, filho, a trindade inteira num primeiro abraço. Só o verdadeiro Pai pode isso. Receber alguém a quem ama mais do que aquilo impedido de amar em si mesmo, posto que vaidade. Ao pai, fica a impressão de ter chegado ao paraíso, porque agora tem a quem ordenar afetos e atos para uma vida útil, melhor e maior do que foi a sua. O Pai – humílimo – não se agiganta nessa empresa, diminui-se para dar espaço, para ver escrita a vogal fundante. O caminho do verbo. Utopia sangrada de dentro daquele desamparo eterno, o pior dos medos. E agora, em vez do pai, abraçamos o filho. Nosso filho. Um desejo, uma diáspora. Esse herói mitológico que não sou Eu nem o Outro, entrementes, admirável. Saiu de nós e não deve nos repetir. Não temer isso é próprio do Pai. Sem dúvidas um amor acrescido. Um continente imenso. Medo de não ser capaz. Mas ora, és o pai. Apenas mais um dos irmãos depois do assassínio. E não importa a fúria com a qual o mande às favas seus filhos. Ao Pai instalado, composto por si e pelo perdão, há orações e improbidades, pois em sua grandeza, ele – o Pai – permite ao filho odiá-lo, temê-lo e inclusive voltar com as mãos abanando caso não consiga se resolver, explicar-se – mostra-se. Uma benção ao revés acontece – em nome do Filho, do Pai e de todo o resto do amor eterno nascido do mesmo úbere. Este é o sinal! O filho finalmente aceitou sua vontade, o desejo paterno de continuar-se além da morte, sem pedidos, sem promessas indevidas. Renovação. Estão ambos perdoados, ambos paternais. Pais, enfim, um do outro. J.M.N.

Um comentário:

Anônimo disse...

Quase um ensaio de psicanálise... Lindo!

Júlia