Não, já não era tempo de pedir. Não era momento de iniciar retornos. Quando a linha se completou e sua voz emergiu do pântano de meus temores mais sutis e repetidos, era hora apenas de escutar. Quem sabe um boa tarde. Quem sabe uma poesia. Não cabiam orações inteiras, apenas eu em sentido latu, com meus genes dominantes a direcionar a fala, a aquecer o instante de redescobrir meus minerais. Estava lento ainda nesse fosso de existência a que me designei. Enquanto ouvia sua voz preenchendo os milissegundos de minha percepção mais remota, adquiri novamente o sorriso que ela me causava e pude atestar que meus melhores momentos foram feitos dela. Nasci assim quase inexistindo, quase uma teoria muito hipotética de cuja certeza a ciência só se banhará num futuro distante. Não cabia nada senão a declaração de que morreria por ela e que não foi a razão que destinou-lhe minhas idiossincrasias e covardias, foi coração. Aberto e devassado como carne de açougue, vendo-se cada vez mais só e livre porquanto endividado e desafiado no cerne de sua entrega. O que nunca disse em tanto tempo de silêncio, vai destas linhas marcadamente apaixonadas, neste instante inesperadamente solitário em que descubro que eu devia ter morrido durante aquele telefonema. J.M.N.
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