Normalmente eu choraria. Destruiria o que viesse primeiro em minhas mãos e depois sentiria uma culpa gigantesca e traiçoeira que me levaria da aptidão à comédia, ao mais barato folhetim de jornal antigo. Um estrago de violinos e oboés como sons ao fundo.
Ensaios nunca faltaram. Minha morte se anunciou algumas vezes. Mas não naquela noite. Não dentro daquele cheiro que me deixou noutra esfera. Deitado calmamente junto aos pardais do outono. Aquecido e retumbante como os sagrados tambores dela.
Daquela vez eu simplesmente olharia o fundo do poço como um outro qualquer. Não seria escuridão ou lágrima ou deserto de abandono. Garrafas de vinho secas, não seria. Não seria déspota, medíocre ou raivoso. Seria eu. Pequeno ou grande como fosse. Seria eu.
E bastou um segundo de sua lembrança morena. Um beijo reticente no início de tudo para eu explodir e fervilhar discursos de amor eterno em marata. Peito expandido. Um crucifixo veio e partiu. Meus braços cerrados em abraço são da imanência, como minha carne de beijar e sentir medo. Tudo apostos no mundo real.
Naquele exato dia em que pensei que findaria num cataclismo secular e brutal eu, na verdade, vivi. E vivi para ver nascer um dia de amparo e sono tranqüilo. Com minha fala pedindo colo sem quase volume algum. Em seus braços morenos eu reconquistei o credo e meu missal saiu do fundo da gaveta. Oro. Rogo para santos anjos protetores mais uma graça: que meu corpo escapulido de prisões e batalhas possa sempre viver mais que meu desespero para trazer na contração potente de sua lembrança, a minha salvação. J.M.N.
Um comentário:
não da pra ler teus textos e não ficar mais leve e feliz! não posso negar , sinto muita falta de conversar com meu escritor favoriito!Parabéns seus textos cada vez melhores , Sou sua fã e vc sabe disso.
beijos
Willianna W.
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