Minha vida era uma festa mal começada, iluminada, mas sem canções, sem os guizos de anunciar chegadas. Minha vida era uma única via sem cruzes ou deformidades. Era um paraíso de mesmas formas, venturas iguais. Eu vivia de porta aberta a esperar uma invasão, um assalto que fosse me cobrar o que eu não tinha. Tinha formas mais repletas de sentido e mesmo quando me sentia amado não estava entregue de todo. Quando te vi passar com os passos nobres e esguios, anunciando a boa safra de grãos e cheiros e enfeites, pude entender que minha vida não começara e essa razão repentina me fez abandonar a segurança de minha casa, pôs-me a correr pelas ruas lamacentas da cidade, escorrer nos dejetos dos becos e a freqüentar as casas baratas por onde soube que passavas. Minha vida era uma moratória interminável, uma dívida milenar. Naquele dia em que te vi passar vendendo inutilidades me botei disposto a sonhar, como jamais havia feito em meus dias. E te encontro em tantas ruas, com tantos homens a vender teus quitutes e entregar tuas formas que não cedo à vontade de me aproximar. Talvez alguns seres sejam como tu, forjados à maneira de impossibilidades, prontos a mudar nossas vidas sem jamais ofertar vizinhança. J.M.N.
Um comentário:
Lindo esse!
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