quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Micro-romance VIII

à memória de Frederica, uma personagem

Madame Desnass sentava toda noite diante das fotos sobre o piano e pedia à sua criada, Suzane, que tocasse algo de Debussy enquanto tomava seu licor de avelã.
De olhos fechados ia de volta aos quadros das fotografias e tentava cheirar os ares daquelas realidades congeladas no tempo. Apesar de muitos momentos felizes retratados, Elise, sentia o travo da solidão ao recordar quem já não podia estar, ao lembrar aqueles a quem afastou por imprudência ou por demasiada reserva.
Fosse o que fosse, terminava com uma lágrima negra caindo dos olhos sempre muito pintados. Uma beleza que escorria de si, como a realidade escorre quando os sonhos se assenhoram de nossos dias.
Ela, talvez, se tornasse uma fantasia. Adorada por alguém a quilômetros de si.
Porém na noite que se tocou Clair de Lune, sua lágrima estava limpa e não havia licor de avelã para acompanhar sua tristeza. Ela pediu que Suzane repetisse a música enquanto começava a dormir o sono sem amanhã e quando a música acabou não havia nenhum sinal de sofrimento pela sala.
Suzane disse anos depois, que chegou a pensar que alguns rostos nas fotografias sorriam de dentro das molduras, como que aliviados de não precisar servir mais às memórias tão tristes daquela mulher. J.M.N.

Era esta a música que Suzane tocava…

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