Eu que me entreguei. Do avesso derramei meu sangue. Verti, escorri e de vermelho pintei teu mundo. Enquanto era desespero, não tinha nome, era um intruso. Eu que interditado me libertei por tanto amar. Um eloqüente mudo nos olhos teus. Atrevi ver-te por entre as brechas, através das ranhuras da porta, pelas fechaduras. Espreitando teu corpo feito uma proibição pagã. Eu que nunca encontrei vestígios do amor que dizias ter, em cujo ciúme apenas imprimias tuas próprias armadilhas. Derramei-me atrás de ti e pelo caminho o pranto também se tornou um rastro que levava a ti. Tudo me levava a ti. Voltei tantas vezes de mãos abanando, com prazeres de menos e coração demais. Por tantos anos acreditei que estavas morta e que minha saudade era a única coisa que restara. Eu que nunca sagrei-me um cavalheiro, por crer que era teu e simplesmente não podia desrespeitar tua loucura, tua baixeza. Quando te vi anuviada, desesperada por outro abandono, tive a certeza de que eras tu. A quem nunca a alma disse chega! A quem nunca o mundo puniu o suficiente. E mesmo na raiva guardada dos anos, pude correr e cobrir o teu corpo, pois quando a tua dor tomou conta da rua e eu próprio senti que morrias, quis provar que ainda era teu e que eu poderia colocar tudo de volta - o que te escapava, o que te exauria, o que nunca tiveste. E naquela noite em que eu te disse dos meus amores, a única coisa que precisavas fazer era morrer em meus braços e acabar com agonia. A minha, sobretudo. Apesar disso, como é teu costume, continuas viva, para além dos meus desejos, rindo de quando eu te ofereci alumbramentos.
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