quarta-feira, 11 de junho de 2008

Males de além

O som da tua voz dizendo aquilo ainda está comigo. Repercute o mais fundo possível nas minhas veias, nos meus calabouços. Nos confins de mim. Está lá a tua voz emblemática dizendo coisas que pensas saber a meu respeito. E nesses gritos sanguinários não escutas o que mais te apavora - o que me dizes é, na verdade, sobre ti mesma!

Dizes entregar tudo, ser por completo. Atreve-te a desdenhar de minha idade e das coisas incompletas que enumeraste em teu diário. Querias que fosse assim, que fosse assado. Invades meus limites mais absurda do que latifundiários. Sem ganância, sem economia, apenas para enfrentar a ti mesma, dando conta do que não podes mais ser.

Negas amar tanto. Negas ter sido esquecida. Negas as horas de dor, pois crês que não precisas passar por isso. Negas um beijo e suas conseqüências sempre tão aflitas entre nós dois. Negas que tua carne esteja trêmula e que os sinais de teu descompasso estejam impressos em tua pele. Coça teu desgosto, sentes o abrir das feridas. Magnólias envolvidas de afeto. Estás do avesso me dizendo tua ira.

Seguro teus braços, mas tua força é inconteste. Destróis meus intentos, machucas meu verbo. Atentas contra minha dignidade. Superas tua derrota com mais e mais vilanias. Estás envolta na misericórdia espúria dos que nunca sentiram. Dás ouvidos aos que dizem - mate-o!

Não por acaso, és amiga daqueles que têm pactos secretos com as distâncias, com os vizinhos das terras de não ser. E morres um pouco ao saber que te decifro, aos poucos e sempre te exponho através de minha entrega. Não suportas o fato de ter me conseguido, de ter conquistado, pois preferes estar sempre no interdito.

Meus braços perdem o vício de te procurar e arrebatado como que por uma ciência imediata de mim, apenas escuto teus pedidos torpes e digo estar tudo bem - minha morte, flores secando, café esfriando e teus encantos deixando de ser. Em algum momento tive medo do escuro e essa cor de que são feitos teus olhos, limitou meu encontro, no fim.

Pediste para que saisse. Pediste para que eu fosse só teu. Pediste para deixa-te sozinha, apenas por aquela noite. Justamente a noite em que mais precisava de ti. Pediste um vintém pelas loucuras, pela pele esquecida, por tua dor invencível.

Um dia terei males de coluna. Entrarei num hospício. Talvez esqueça de ti. Um dia como hoje é recanto, tem certo gosto de amoras. Faz-me querer viver mais. Hoje é como um ponto final no meio da vida, onde tudo o que eu mais queria era ter te visto pela última vez. J.M.N

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