quinta-feira, 22 de abril de 2010

Cartas a ninguém (22.04 – 03:28h)

Caro Joaquim,

O que segue resulta do ir e vir desta luva de extremas memórias que toma minhas letras durante a insônia. Desde toda a vida tenho esse chiste de recolher coisas que ficam internadas em mim e quando menos percebo me escapam pelas ranhuras de uma página ou de um sonho muito branco. E como nada é mais forte que isso, Joaquim, hoje foi ela quem me serviu de tinta e tentou a minha mais funda tentação de esquecer e viver livre, gozando da incerteza que nos é dada no momento mesmo do primeiro choro.

Incomoda-me incrivelmente que não lhe tenha criado dizeres capitais como as frases dos condenados à execução. É mais que um insulto não lhe haver ditado meus gozos a guisa de odes em inspiração altíssima. Mas tu que és letrado, explica: com quantas línguas se forja um colar de manhãs que era tudo quanto queria fosse dela? Explica como se entra no esconderijo da noite para desfrutar o melhor daquela presença, as incríveis forças que cresciam de sua respiração tranqüila ao meu lado?

Ando sem respostas, meu caro. Ando a concentrar meus esforços na criação do mais terno olhar de perdão. Não uma oferta, um pedido. E como a calma celeste que desembainha o dia para sangrar aqueles que buscaram ilusões, cabe a mim um golpe mortal. Uma estocada final na arrogância de minhas verdades mais robustas, mais trazidas da casa de meu pai. Ajuda-me, mesmo da distância acontecida sem desejo mútuo, a ignorar estes risos que nascem a meio lábio, que crepitam trágicos sem razão de ser. Ajuda-me a defender a pouca paciência e responsabilidade que minha avó cultivou em mim.

Caríssimo Joaquim atenta a esse humílimo fruto de vigília sem fim. A esta desgraçada sorte de derramar vontades e entrega e razões sem força alguma para vingar a inocência, o arroubo de ser-me. Caso seja demais este meu pedido, então, apenas abre a janela em sinal de sim. Pois mesmo que não desfiras passos que venham ao meu encontro, mesmo que não concordes com todo o passado entre estas linhas e minha solidão de agora, saberei através deste teu gesto que, tal como eu, enxergas esperança em algum lugar deste céu que nos abriga.

Sinceramente,

J.Mattos

4 comentários:

Anônimo disse...

Pra que falar,
Se você não quer me ouvir,
Fugir agora não resolve nada.

Mais não vou chorar,
Se você quiser partir,
As vezes a distância ajuda,
E essa tempestade um dia vai acabar!

Só quero te lembrar de quando a gente andava nas estrelas,
Nas horas lindas que passamos juntos,
A gente só queria amar e amar,
E hoje eu tenho certeza: a nossa historia não termina agora!
Pois essa tempestade um dia vai acabar!

Quando a chuva passar,
Quando o tempo abrir,
Abra a janela e veja eu sou o sol.
Eu sou céu e mar,
Sou céu e fim,
E o meu amor é imensidão.

Anônimo disse...

Belíssimo texto. Acho que é uma das melhores coisas que escreveste no blog.

Digno de um grande romance, parabéns!

Lilian

Anônimo disse...

Nossa, que texto lindo. De uma entrega absurda. Quase dá para sentir o sague e as lágrimas que o ajudaram a nascer.
Essa carta a ninguém (quem é Joaquim?) parece um grito de amor e entrega.

Fiquei muito mexida com ele.

Melissa Narano

Anônimo disse...

Como tudo que mais nos abre o peito. Como tantas coisas desmedidas. Como a vontade de ter feito tudo diferente. Como querer voltar e não saber como.