quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Porque ela chegou tarde demais

Ela veio quando eu já tinha pernas e braços, podia morrer por ai, enlaçar corpos potentes ou fracos demais. Ela chegou depois que a maior madrugada que tive, acabou na boemia de um porto egípcio – uma história que nem sei se é minha. Ela veio depois que eu fraudei a receita, andavam me procurando. Carnês de pagamento na mão. Um vexame. Ela chegou tão depois de eu ter sentido o sangue entre meus dentes e, obviamente, depois de eu ter corrido com a carne roubada por ai afora. Ela chegou com sua certeza e finesse muito, mas muito tempo depois de eu ter esquecido regras básicas de convivência, de como utilizar os talheres. Ela chegou bancando a oferta de quem me deixara penhorado. Ela chegou para policiar territórios, muito depois de eu ter me tornado um ausente, um cigano, um preposto de atavismos, de ideais, de eleições do óbvio. Ela chegou atrasada no único dia em que não poderia – minha partida. Sem poder dar adeus ela chegou perguntando se alguém me vira, se sabiam como me encontrar. Mas eu estava lá. Nem escondido nem às vistas. Estava ao seu lado, ao redor de seus medos. Eu estava sendo preciso no que eu sentia e muito maior do que me cabia no peito, meu coração dela se enchia. Mas ela chegou muito tarde. Chegou a mim, antes mesmo de ter chegado a ela. Que longa estrada ela tinha. O presságio me disse que esta imperícia teria um preço. Mesmo antes de ter-se chegado, ela demorou muito tempo buscando as razões de não se encontrar. E sem uma coisa nem outra – razão e tempo – ela ficou perdida, acenando para quem não estava mais. J.M.N.

2 comentários:

Anônimo disse...

que triste isso :_(

Anônimo disse...

Despedida compulsória. Encontro de diferentes tempos, objetivos, razões. Sei que não pode ser, mas assim quis.
E viva o poeta.
Beijos, Emanuelle.