Vou chorar agora. Entregar-me ao desespero de nunca mais levantar ao teu lado. Abandonado na compulsão do choro. Queria te levar para Paris e afundar meu rosto no teu seio contraído de frio. Ter com força, te machucar um pouco, como de costume. Começo a pensar que sou egoísta e que tudo o que fiz e faço é apenas para estar neste estado latente, como num precipício constitutivo, perto da morte, sempre. Meu choro comove a todos menos a mim. Estou tão cansado destas lágrimas que as desfaço com gritos de ódio. E sempre na frente do espelho. Plantei algumas árvores, tenho um livro à espera, viajei o mundo e me destruo pouco a pouco nessas inconsistências divinais de paixão e gozo. E tu que nada tens e tanto tiras dos outros, o que és? Por que me deténs? Que claustro é esse que me aninha? E quando sinto a hora derradeira me partindo ao meio, meus estertores são para aquele menino que nunca me abandonou, mas que foi imensamente abandonado. À própria sorte recorreu às mamas secretas, aos frascos de odores proibidos. Ainda que queiras sou demasiado antigo para que me destruas. Andei muito tempo nos jardins do éden, sem ter o direito, sem saber de paraísos, cantando as melodias dos banidos, dos mequetrefes da longa noite. Estive em Vênus. Andei por Tebas e ao fim dos dias de infância, já estava metido nas coxas graúdas, despojado de mim, entregue à ruminância da carne pela carne. Um aventureiro sem rumo, sem pudor, cujo menor pedido foi ter tudo. Acho que a morte me cai bem. Corrija-me se eu estiver errado a respeito das coisas nas quais acreditas:
- amor demais não é bom!
- nunca ter é sempre ter!
- juro que quero a normalidade, mas sabe do que mais, por que tê-la se não faz mal algum?
Um dia sento à beira do caminho. Vou para Lagash comer tâmaras perfumadas. Compro-lhe uma encharpe de seda pura e talvez passe em tua casa apenas para mostrar que, afinal, morrer também faz bem às vezes e aquilo que nasce com o choro de desespero, de abandono, não deve jamais ser esquecido.
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