Nasci na forja dos desatinados e fiz razão sem ter nenhuma.
Sou o oposto do que o medo rege, a impossibilidade, paralisia. Sou caminhante,
puramente. Sempre em movimento está meu astro. Quando veio a mim o primeiro
homem, comi seu casco. Como uma besta a pedir divindades. Sou o que sou. Quase inteiro.
De certo, risonho. Desses sorrisos que quando em quando enchem teatros. Sou
mais da pena e das escrituras que quando entendo saber de menos, escrevo mais. Meu
mundo passadiço é uma história mal contada. Caibo entre teus braços. Toma-me,
senão escorro. Afeita-me, senão desgraço. Em tua boca roube o ar que me anima.
Era um beijo lancinante e quase escravo. Quando te vi desgraçada e branda,
acendi. Pus pólvora e chamas entre teus músculos. Voltei a escrever o que
ninguém habita. Dentro do meu corpo de palavras desapegadas cabe bem mais que a
eternidade prometida dos amantes. Muito mais que as paralelas de Euclides. Não
os encontraremos nos saguões finíssimos. Sou do brejo e da fome. Do seco deserto
de muitas luas. Escrevo essa claudica oração sem améns, sem anjos que a
repitam. Justamente por saber que a poesia a tudo enfrenta. Inclusive essa
ferida recém-aberta. Essa pústula flamejante que me desassossega. Como impedir
que sintam pena do que eu choro, agora depois que todos os mortos me atropelam?
Como pensar que estive em Gaza e na Macedônia, quando eu estava perdendo as
forças dentro dela? Aqui e ali me aborrecem e no vago enterro desse meu corpo,
deixei bem mais que uma oferta. A verdade desabalada em página branca. Fui
senhor de dois castelos e um bordel. Nos primeiros fiz fortuna e no último
causei nos ventres. A ululante canção das eras. Pariu-se o que deixei macerando
por anos. Era minha solidão acontecida. Deu-se que na pessoa que lhe deu forma,
a própria história acontecida era a minha. Não sei o que digo senhores e
senhoras, mas de lambuja botei na página o que me intriga: pode qualquer Deus me
salvar das paixões? Pode qualquer humano me impedir de ser sozinho? A resposta
deixo a ti, quem me lê e ri. Cretino escrevendo baboseiras. De fato, balbucio
algumas letras. A palavra que me falta é de um azul impossível. Eterno seja a
página que me suporta, pois que não mais me suportam essas mil vidas.
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