25.05.09
A porta bate. Existe no ar uma série de arranhões e ferimentos ditos. A vergonha impede o caminho do olhar - o meu. Outras coisas tantas retornam para somar-se ao nada que se instala. Vaga de conforto, de pertencimento. Uma sensação de estar sem dentro. No fundo do ouvido, um sopro de segredos ainda frementes, inegáveis, porém sinceros, mas que na luta por um pouco de razão agasalhan-se na confissão silenciosa de quem perdeu. E não saem; morrerão doídos feito mãos envergonhadas. Não encontro dádivas para ofertar. Oração nenhuma vai sossegar minhas noites. Nossa foto, abraçados no frio de fevereiro, voltou à estante. Ficará lá para sempre, reconhecida como a única sanidade habitada, como a felicidade que anunciaste irrecuperável. É irremediavelmente doloroso sentir-se demolido, aniquilado. Falido por não ter meios de limitar meus investimentos, meus gastos. A vergonha senta ao meu lado e toma uma dose de vodka. Acabamos juntos a bebida e ela - a vergonha - antes de mim anuncia seu sono. Neste preciso momento finalmente fiquei só. Lembra dos quebra-cabeças a dois? Não os tire de tua parede. Tento sem sucesso recompor o que me reuniu ao saldo dos desesperados, dos mortos de fome. Insaciáveis pelos gostos intensos, mas fugazes. Tento lembrar de quando virei este ser que desconheço, mas desisto quando me lembro de tuas palavras: foi assim sempre. Quase sem forças para botar-me na cama, deitei com o corpo dormente. Não lembro das rotas que tomei para o esquecimento, mas lá cheguei, quase perto de despertar e reconheci o fundo branco do recomeço, com menos brilho do que naqueles anos em que nos pertencemos... Por hoje, apenas por hoje, queria realmente saber te explicar quem eu sou e, não fosse pedir demais, saber um pouco mais disso para mim também. J.M.N
Um comentário:
Ainda restam muitas lembranças e objetos que comprovam os tempos de pertencimento. O quebra-cabeças ainda está na parede, talvez fique lá por mais algum tempo, o tempo necessário para construir novas lembranças.
A.R.
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