quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Cartas a Ninguém (23.01.2013–19:47h)

Querida,

Há muito não te escrevo. Nenhum motivo à mão para te apresentar. Entretanto, não posso dizer que foi somente um silêncio. Existe um motivo, certamente. Mesmo que ainda me seja oculto, desavisado ou, simplesmente, reservado ao mundo discreto dos meus esquecimentos.

Dia desses fui à tua casa. Aquela sem portas e janelas. O abismo do entregar-se a qualquer preço, mesmo que seja a carne toda investida num único beijo. Fui para meditar sobre a frequência cada vez menor de minha angústia em relação à felicidade.

Como sempre, andando nos avessos.

E te encontrei por lá toda limpa, cores diferentes nos cabelos, nos olhos, no costume das roupas. Estavas na moda. Na velha vitrine que oferta e, cujo estilo, espera ainda alguém que desabotoe do engasgo finalmente. Estavas simples.

Fixei uns minutos tua presença. Não me viste. Não fiz questão de me mostrar. No fim dos minutos tudo passara. A saliva secou na boca. O vento extra da respiração exauriu. Mudou o ressonar de minha pele à tua presença. Eu estava descansado. Eu estava completamente.

Nesta hora tive a certeza de que em mim, o poeta nasceu primeiro que o homem. E o que mais o poeta encerra senão o mundo dentro de si. De maneira que minhas cicatrizes são as mesmas que separam os continentes e, no entanto, cabem em mim os bilhões de esfomeados que nos acercam. Os mesmo todos infinitos que esperam para ser o que eu já fui.

Soprei-te um beijo convincente. Passaste a mão na nuca, quase se declarando ao arrepio. De repente alguém chamou meu nome e eu voltei de onde estava enquanto te via existir tão distante. Voltei do mundo íntimo que me procria. Cheio de sal e textos e Orixás.

Sou aquele que protegido de mim mesmo, ainda comete infinitos em nome do que levo dentro. Uma inteireza por não saber nada sobre o futuro. Esta certeza de que meu passado não reclama mais o retorno dos meus passos.

Sinceramente,

J.Mattos

4 comentários:

Anônimo disse...

Com entusiasmo recebo teus escritos. Sempre poeticamente liberto dos erros, das culpas, das amarras. Tua unicidade é tormenta e magnetismo.

Anônimo disse...

Através da memória, o passado sempre reclama, reivindica..
Amores, lugares, músicas, tempo percorrido.

Tainah Fagundes disse...

Amores, Saudade, Delírios e Tempo.

Bjs meu querido.

Adelaíde Ferreira de disse...

A manhã surge, o amarelo ofuscante do sol a cada raio mais forte e tua poesia pra acalentar e desassossegar - ou seria reanimar?
:)
Mais vida! Mais infinitos pra ser muitos, já idos e os que ainda virão! Namasté!