quinta-feira, 3 de abril de 2008

Volta

Para os eventos do dia 08/11/97.

Ontem deixei contigo muito mais que um adeus. Deixei minha terceira pessoa. No singular, inscrita sem jeito naqueles meus ditos tão absurdos. Ele, a quem chamo de tolo, de estúpido não teve piedade. Olhei teu olho irrigado e tive a impressão de que passei por lá. Há tempos. Talvez tenha deixado lembranças. Uma imagem bem sucedida, o entendimento de que meu sorriso era sincero, não sei.

Queria suprimir minha angústia de modo a perdoar minhas faltas e não repetir os gestos como lamentos ou indelicadezas.

A uma da manhã tudo virou do avesso e eu decidi partir sem resolver a questão, mas dando um ponto final e talvez tenha sido essa atitude que a deixou tão triste. De minha parte, um devastador sentimento de insuficiência, inadequação, como sempre imaginei que seriam os momentos em que deixamos o grande amor congelado no tempo, por completa falta de coragem, de dureza.

Afinal, do que se trata? Em resposta o tempo, e apenas ele para recompor os trajetos absurdos de outros tempos e reduzir o peso das aflições através de pequenos reencontros com nossas próprias pessoas. Uma história que se extingue. Um mistério que se instala.

Inalo tuas memórias recentes e percebo que minha pele resseca sem teu toque. Disse-te que era uma fase e talvez em um ano ou dois, estaríamos novamente juntos. Quero acreditar nisso, mas não devo. Anteontem encontrei um outro ser morando no espelho. No susto dei-lhe o meu nome. Fiz mal. Agora, todos os dias, tenho a impressão de que muitos outros estão presentes naquela imagem desgastada. Eu e minhas pessoas sucessivas. Um saldo acumulado daquilo que deveria ter sido deixado para trás, mas que de maneira irrestrita veio junto comigo por todos esses anos.

Então, quando noutra existência estiveres satisfeita com teus cremes e literatura ou eu próprio me encontre são, sem seqüelas, falaremos do maldito dia em que te disse adeus. Até lá, talvez tenhamos forças para viagens, recordações, coleções de selos, imagens de gnomos, imãs de geladeira e todas as porcarias que consumimos quando estamos sozinhos esperando encontrar alguém.J.M.N

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