quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Sonhos Diurnos I – Amanhecido


Quem sou eu que dispensas depois das duas da manhã?
A pergunta nasce a despeito da semântica.
Perdido!
Como se fosse o único andarilho da noite depois do silêncio do corpo.
Não faz frio, mas a espinha curva e os pelos se enervam cobrando amenidades que não vêm.
E a pergunta volta entre os dentes: que faço agora?
Como seguir depois da descoberta?
Não sei que sou; não sabes também. E agora a madrugada tampouco me entende.
Sou esse corpo se esforçando pelo caminho dos gatunos. Entretanto, roubo nada mais que a luz dos postes. Vou me esgueirando, rótulas doídas. Nossos movimentos ainda reclamam minha memória. Meio tonto, só penso em despertar.
Ao que parece fiquei nas profundezas de um sonho.
Quase manhã.
As janelas em volta começam a abrir.
Eu caminhando.
Baratinado pelo esforço de descobrir como fizeste isso – de eu não saber quem sou. E tenho essa ideia bárbara de voltar e pressionar tua garganta para que cedas, para que morras, quem sabe.
A punição pelo pensamento é uma saudade exclusiva suscitada em mim quando me deixaste estupefato ao me mandar embora.
Minhas tatuagens se contorcem e escrevem em minha pele o que não ouso dizer: teu nome, a vontade, a intolerância aos limites. E então eu volto. Por todo o caminho recém-desperto pelo sol.
As pessoas batem tapetes, conversam umas com as outras, atiram seus lixos no meio da rua.
Nada me atinge.
Resoluto, bato em tua porta. Outra pessoa abre. Uma mulher que recende a cigarro. Logo atrás seu companheiro me pergunta o que quero. Chamo teu nome. Mas a porta se fecha antes de ouvir qualquer resposta.
O endereço confere, a cor da porta, os enfeites no corredor do prédio e até o porteiro tem uma cara conhecida.
Perto do meio dia ainda busco uma resposta.
E depois de dois dias seguidos, resolvo acreditar que o frio que apenas eu sentia ao sair da tua casa naquela noite, consumiu alguma coisa secreta em mim. E me tirou umas horas da verdade que encontrei contigo aquela noite, deixando esta sensação estranha de que nenhum outro lugar do mundo me receberá tão bem como o teu abraço. J.M.N.

Nenhum comentário: