terça-feira, 9 de setembro de 2014

De duas ou mais vidas

"Por que as coisas se arrastam sobre
as cantigas... Tenho novamente as liberdades de
morrer e te conquistar."
 
Cantídio - Do livro dos artefatos do nada 

A toda hora me venço. Sou um punhado de coisas ínfimas feitas de um homem, carne e entranhas amedrontadas, mas certas de que seria uma estupidez fugir do desejo. Enseada tormentosa em plena solidão. Ao que vejo, meus prêmios, minha comida, meus alimentos, tanto adoçam quanto amargam. Corro ao redor como se fosse uma olimpíada o que sinto. Arcos, flechas, fogueira e vitórias. Em quantos anos poderei contar meus senões? Por hora a quilometragem vira. Assusta um punhado especial de pessoas. Mas vou saindo daquela prisão de pó e minimalismos. Arco com as coisas por onde estou e escrevo. Impiedosamente arriscando sempre o dobro. As contas estão altas. Violetas e pastiches me atraem igualmente. Quando sereias e melros virão ao encontro? Sei que a queda e a escultura que me fizeram doeram igualmente. Vou sobre a ponte, rindo da risada afetada que o destino me dá. Sobre mim um luar imensamente amoroso e déspota, concomitante. Sob meus pés a madeira que me sustenta e as águas turvas do rio. Se cair – ou quando cair – espero os peixes cardumes fazendo vertigem, me levando em nacos apetitosos. Nadarei de costas sob o luar. Vou me encontrar com a menina que me perguntou quem eu era e, com isso apenas, recebeu de volta o amor de duas ou mais vidas. J.M.N.
 
Para ler escutando...
 

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