Espera um pouco. Quero
aproveitar que abristes a porta pra te falar algo. Te contar da falta que fazes
na mesa do café. Que perder o sono tornou-se insuportável sem a surpresa de te
ver chegar devagar na sala com os olhos ainda intocados pela madrugada. O que
quero te dizer é simplório. Talvez não seja mais que ficar em silêncio diante
de ti a me espantar com as nossas semelhanças. Desculpe te dizer, mas quanto
mais te diferencias mais te pareces. O teu quarto cerrado me faz lembrar
aquelas gaiolas cobertas com um tecido branco e um passarinho dentro. Não ver
esses passarinhos me deu sabedorias de adolescências.
Sei que dentro do teu
confinamento enfrentas monstros e esperas um beijo que te conclua. Mas não que
eu ouça. Não que teu irmão veja quando te brecha deitado no chão por essas
horas de infinita solidão que é a infância. Ele te ama como se ama a própria
vida. A saudade que sentimos de ti tem cheiro de penas caídas. A tua beleza me
exaspera, tem vezes. Piora quando sei que as promessas de infância todas já
perderam a validade.
Desculpe meus gestos e
sentimentos irrefletidos. Volte pra sua oficina de voos e desassossegos. Aprendi
contigo que vida é metáfora e metamorfose. Tenho aprendido a esperar, sabe.
Qualquer dia te busco na escola e conversamos. Gosto da tua voz baixa, da tua
timidez e desse jeito de estar no mundo sem querer ser notada. Só não me deixes
à mercê da idade e da memória, e sem essa coisa que verdeja dentro de mim
quando ouço o barulho da maçaneta do teu quarto. WDC
5 comentários:
Do mais profundo da minha alma te aviso: se querias que trazeres pra cá pelo ar de um suspiro, conseguistes. Belíssimo!
Que lindo.
Rita
Que lindeza, Wagner.
Que coisa mais linda.
Lindo!
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