Às três da manhã eu levanto em sede e sono, desregulado. Chego ao pote de biscoitos, encontro a sobra da carne do jantar. Minhas mãos caminham feito aranhas pelas paredes a procura de um interruptor. Tateio o macio molhado da esponja de lavar louças, penso no asco que sinto entre sabão e restos de comida. Certamente fiz uma careta. Meu joelho foi na direção da tragédia. Meu cotovelo beija a quina do armário. Um raio agudo percorre o corpo. Amanhã haverá hematomas por todo canto do corpo. Mesmo assim não acordo. Encontro a água, o copo transborda. Me farto na mentira de matar a sede que é própria de toda água, o copo flutua. Não sei de onde vem um cuidado secreto e quieto que me acompanha na vida inversa do meu sono andarilho. De repente tudo faz sentido na semi existência noturna. Volto por outro caminho. Não conheço obstáculos. Meu joelho parou de doer. Tenho um guia que me entrega suave ao mesmo ponto da cama. Os travesseiros se ajeitam. O cobertor vem por sobre. Calor e tranquilidade. De manhã sou sempre calado. Recebo um beijo. E finalmente ela pergunta se meu joelho está doendo, se eu tive um sonho ruim ou se sentia frio, mas não queria desligar o ar condicionado por sua causa. Segundos em silêncio. Seu rosto é tudo o que vejo. Agradeço no íntimo a sua presença. Não, nada me dói, nem sinto frio, mas desligaria o ar por sua causa. Ela me beija. Meu dia começa. Percebo que é sempre assim desde que ela está em minha vida. Sou guiado durante o sono, saudado na vigília e isso sem nem sequer haver um nome entre nós. Sem nem ao menos termos feito votos de comprometimento. Acontecemos, simplesmente. O rastro da proteção da noite ainda me encima. Hoje sou eu quem conduzirá a madrugada e ao seu mínimo desassossego, devolverei justamente o que nos une, aquilo que nem precisa ser dito para sabermos que se encontra, seja nos descaminhos do sono, seja na claridade do dia. J.M.N.
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