Lá fora a chuva cai e deflagra aqueles sentidos esquecidos – tranqüilidade e adensamento. Algum conflito, necessário confessar. Sinto o espírito quieto, mas atento e quase posso ouvir a algaravia dos meus porquês. Acompanho as gotas dilacerando-se no caminho à calha da janela. Existe algo de muito próximo nesse movimento. Como uma encenação do que me aconteceu. A água chega tão forte ao vidro e logo se recoloca, perde a força e se torna um filete sem rumo, a cair pelo efeito da gravidade e sumir, algumas vezes, antes mesmo de chegar ao fim. De repente alguém bate à porta. Tenta entrar. A porta está trancada. Levo alguns segundos para entender onde estou. O trabalho me consome (ou seria o vício?). Corro para abrir. A funcionária esquálida me entrega um monte de papéis e diz que estão todos esperando por mim na presidência. Digo que já vou. Ao sentar, encontro coisas rabiscadas no bloco de rascunho. Uma nota me chama atenção: retornar, desfazer a impressão de que deixei de querê-la. É possível escutar o mar em conchas? A chuva continua. Penso na reunião. Risco a nota encontrada e escrevo ao lado: preciso escolher melhor os dias de chuva, de modo que não seja tão triste essa chuva em meu coração. E como se isso fosse um poder meu, saio convicto para o andar de baixo. Ninguém imagina o que se passa entre meus olhos e a existência diminuta de gotas de chuva morrendo na janela. J.M.N
Belém, 23 de dezembro de 2009 - 15:39
2 comentários:
Tens escrito coisas lindas,intensas e bem mais próximo dos sentimentos humanos.
Bons textos,adorei.
Abraços,
Hellem.
Acabo de chegar da rua. Belém, como sempre não oferece muito. Mas lembrei deste espaço. Destas tuas palavras tão sentidas e vivas. Quando li pela primeira vez estava procurando coisas na net para esses momentos de chegar e não conseguir dormir. Que bom que encontrei.
Abs,
Bianca.
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