terça-feira, 18 de novembro de 2008

Anistia

Algumas vezes escutamos histórias ou passamos por situações que nem imaginávamos. Seguido a isso as reações são as mais variadas. Alguns choram, outros morrem um pouco, outros como meu grande amigo aqui homenageado, simplesmente escolhem viver e contar suas histórias. Este texto é para ele... meu amigo distante a quem carinhosamente chamo de "Grande Homem".

Enfim avistaram Calle La Salette. Havia mudado pouco. Os bangalôs erguidos sobre o asfalto ainda muito negro. As pessoas curiosas vendo chegarem juntos aqueles rostos atônitos. Ninguém pôde reconhece ninguém logo que se viram. E como um encontro combinado às escuras, aqueles que chegavam – ou voltavam – continuaram em passos lentos, apreensivos. Aqueles que estavam às janelas, de pacíficos foram ficando inquietos depois espantados e finalmente exaltados. O choro foi quase integrado. Uma orquestra de reconhecimento mútuo, de espanto, de esperanças justificadas. Um a um, os rostos antes pobres de expressões foram mudando. Angústia, medo, procura, mas, sobretudo, felicidade. Como havia muito não se sentia na cidade. Os abraços no meio da rua sucederam-se, criando um bolo de corpos que já se procuravam fazia tempo. Uns incrédulos, outros certos de que haviam deixado os pertences de seus entes nos lugares de sempre, pois haveria de chegar o dia do reencontro. Mães, filhos, irmãos, vizinhos apenas. Um mar de reencontros, mas também de notícias ruins. Talvez já não seja importante falar desses momentos, contar essas histórias. Ainda resiste o odor daquele dia e as paredes ainda guardam as tramas sigilosas. Nas ruelas tristes, nas peles cansadas, nos olhos desenfreados a consumir infinitos, existe tempo, existe vida. Voltaram de longe e com dores secretas. Os corpos não eram os mesmos. Voltaram sedentos pelo sono abundante, pelo pão das manhãs e as mornas toalhas de preparar as mãos para as refeições. Um dia haverão de contar seus estados, de dizer suas ruínas, apedrejados que foram por um regime absurdo. Um dia haverão de acordar e dormir como antes, remotas crianças da cidade a contar a história dos acontecimentos com a sabedoria dos antigos. Mas até lá, o forte cheiro do regresso é que fica e as tardes escuras anteriores ao reencontro, são apenas sanha e pólvora recém usada. Um borrão na saudade evidente.

Nenhum comentário: